terça-feira, 8 de abril de 2008

Sobre o turismo e a nobreza

Em julho do ano passado o escritor Will Self quando questionado sobre sua preferência entre estar naquele momento em Londres, ameaçada pelo terrorismo, ou em Paraty, durante a Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), disse: "Em Paraty. Mas este lugar, vocês sabem, não é real. Como todo lugar que é dominado pelo turismo, isto aqui é inventado, é algo criado para os que vêm de fora".
Antes que alguém me encha a paciência falando isso ou aquilo ou me chame de pessimista ou qualquer coisa do gênero, não tenho os números do setor do turismo de 2007, até poderia buscar, mas não é o métier desta análise.
Dom João de Orléans e Bragança possui um casarão sensacional em Paraty, herança de sua nobreza. As portas são contornadas de verde bragança e é a única casa em meio de terreno. Segundo D. João, a inexistência de um fácil acesso à cidade durante muito tempo salvou tudo por lá. Hoje, paradoxalmente, assim na frase de baixo, ele afirma que investe em comprar e vender terrenos com vistas ao turismo. Detalhe nobre, o casarão é o único do antigo casario que dá de frente ao mar, todos os outros estão para a rua do comércio. Seria Will Self um defensor do atraso então? Estaria nessa frase de Self todo o seu pensamento burguês, mas da primeira burguesia, que decepava nobres há duzentos ou trezentos anos e construía casas para a rua do comércio?
Todos olhavam para o comércio, assim como ainda olham os europeus, os urbanistas latino-americanos que falam mal dos shopping centers, e isso deixa a Europa lindíssima como é hoje. Mas como todo comércio, tem começo, meio e fim. Um dia morre, por isso ou aquilo, mas está teorizado, morre.
Desde que a burguesia e a nobreza nasceram do nada ou de "quando um homem resolveu cercar um pedaço de terra e disse que essa é minha", existe essa busca da humanidade por respostas em nossas existências complexas. Hoje nos jubilamos com o turismo em ascenção: "Mas com consciência ecológica", me diria o secretário de turismo de algum lugar. Estará no turismo muitas das respostas que procuramos? No turismo?! Enfim, depois de tudo, como deve ser bom ser de família real.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Eu tive exatamente a mesma sensação de Will Self quando, em 'la reina del Plata', estava a reparar casais dançando tango em cada esquina da Calle Florida. Aquilo me soou extremamente falso, um verdadeiro show para turistas trouxas, que após vídeo e fotos, retribuem com um par de dólares. Sem querer discutir artisticamente a dança que fez a fama daquele país, limito-me a questionar o verdadeiro caráter argentino desta manifestação, sociologicamente falando. Leva-se a crer que, em cada casa, em cada família e em cada bairro se respira tango, e que ele faz parte da alma de 39 milhões de sul-americanos com uma cultura que vai muito além destas imagens criadas pelo cinema e pelo imaginário popular. Quase apanhei por aquelas bandas ao levantar esta questão, mas para mim esta foi só uma maneira de constatar que trata-se de uma catarse colectiva mesmo por lá, pela grande maioria que não sabe dizer outro grande nome do tango fora Gardel (genial, aliás).

7:36 PM  

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