terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Papel e responsabilidade

Quando pequenos devemos receber afeto, proteção e toda a subsistência de nossos pais, que nos conceberam e depois nos criam como seus. Essa relação de papel e responsabilidade é muito clara porque é inerente a natureza animal. Uma mãe protege suas crianças como uma leoa protege seus filhotes. Os papéis e responsabilidades de pai e filho são muito claros e bem definidos e os pais que não protegem seus filhos são condenados pela sociedade.

Já a relação de responsabilidade inversa não tem regras tão "animais", fixas e determinadas assim. Lembro de quando era pequeno ter algumas responsabilidades como arrumar a cama todos os dias, ter boas notas na escola e não dormir depois das 10 horas da noite. Isso em troca de que? De nada. Pois não é nada mais que a obrigação de meus pais me protegerem e me proverem toda a subsistência que me devem, assim como uma leoa deve aos seus filhotes. Me recordo também de algumas vezes trocar uma lavagem do carro por um picolé de brigadeiro da Yopa.

As relações de papel e responsabilidade no mundo dos negócios são claras? Para alguns sim, para outros nem tanto. Assim como um ator que recebe seu texto, é dirigido e depois pago pelas apresentações, pessoas são contratadas, treinadas e levadas a crer que suas funções não devem ultrapassar a descrição do cargo. Para mim é lógico que sempre se pode fazer algo além, e fazer algo mais não significa começar a trabalhar antes das 8 horas da manhã e parar depois das 6 da tarde.

O que não é claro para muitas pessoas, por culpa da educação que recebem, é que em nem todas as relações que temos, somos filhos com pais obrigados a nos cuidarem de forma incondicional e leonina. E mais, as empresas pioram essa situação não dando a noção clara de papel, responsabilidade e resultado. Sim, resultado. O que ganho eu estudando um pouco além do que me é exigido? O que ganho eu pensando nessa empresa como a forma de me transformar profissionalmente e me tornar um ativo realmente necessário no mercado daqui a 1, 5, 10 anos? Se essa noção não é ensinada em casa ou na escola (falo desde o ensino básico até a universidade), a empresa deve fazer algo para permitir que isso apareça na cabeça de seus profissionais. É o mínimo de responsabilidade social.

Empresas que não pensam assim estão presas no século XIX, quando senhores de engenho lotavam seus latifúndios de serviçais acéfalos. Ora, se algo muda claramente desde o início dos anos 1990, são as relações entre empresas e seus funcionários, esses últimos passaram a enxergar o mercado de trabalho como um mundo de negócios e assim grandes empresas ganham com profissionais mais empenhados em suas funções, mas os perdem rapidamente para outras empresas que tornam a relação de papel, responsabilidade e resultado mais clara e factível para aquela pessoa. Perdem também para o empreendedorismo. A linha que separa o empreendedor do profissional de uma empresa é a visão de oportunidade. Larry Page e Sergey Brin não tinham nenhuma empresa os mostrando que se assumissem o papel de desenvolvedores de um sistema de busca, com a responsabilidade de torná-lo vendável a algum bom investidor teriam como resultado a invenção do website que tornou a Internet uma novidade pela 2ª vez, o Google.

O que cada vez fica mais claro é que o mundo corporativo como é hoje está em mudança rápida, constante e com vetores indefinidos. As empresas, consequentemente, as pessoas, vão despertar para seus papéis e responsabilidades. Isso os trará uma visão muito mais clara dos resultados que podem atingir, o que abre uma janela de oportunidades a todos, empresas e pessoas, se é que há como separar uma coisa da outra.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Presunto fatiado

Segundo a Wikipédia, vantagem competitiva é a vantagem que uma empresa tem em relação aos seus concorrentes.

Minha namorada e eu íamos para minha casa jantar e paramos em uma padaria perto para comprar pães e alguns frios. Essa, uma padaria mais cara do que as outras. Costumo ir lá porque é a única da região que fatia o presunto na hora, o que é extremamente importante para a minha namorada e imagino que para muitas outras pessoas. Paga-se mais caro pelo presunto, que é sempre igual em todas as padarias, porque ele é fatiado na hora da compra. Mas chegamos tarde.

Já passava das 21h40 (o estabelecimento fecha às 22h), e detalhe: quando nós dois percebemos que iríamos conseguir chegar lá antes das 22h ficamos felizes da vida, porque iríamos ter tempo hábil para pegar alguns gramas de presunto e queijo. Fatiados na hora. Mas como escrevi, já passava das 21h40. Quando pedi para a moça do balcão que fatiasse 100 gramas de presunto, me disse taxativa e negativa: "Eu já lavei as máquinas". Ou seja, não teríamos o presunto como minha namorada gosta, teríamos de nos contentar com aquele presunto fatiado há terríveis três horas e meia, descansando e murchando em uma bandeja de isopor sufocada em um balcão refrigerado apinhado de provolone, presunto, copa e peito de perú. Fomos embora sem nada e decididos a comer outra coisa.

Me toquei que aquela padaria linda, cara e cheia de coisas finas não serve pra nada se não tiver presunto fatiado na hora. Todo o investimento em balcões, geladeiras, fornos, móveis e iluminação, além dos dias investidos em recrutamento e seleção, treinamento em atendimento, cursos de panificação em algum SENAI ou SENAC da vida, uniformes feitos pela melhor costureira de Curitiba, tudo, absolutamente tudo, pode ser jogado no lixo sem o presunto fatiado na hora.

Quantas empresas perdem clientes e mercado porque não investem no que realmente são boas? Quanto dinheiro é jogado fora investido em coisas que não são percebidas pelos seus clientes como seu diferencial, como a sua vantagem competitiva em relação aos concorrentes? É claro que toda a alegoria de decoração é necessária para que a vantagem competitiva seja identificada pelos clientes, mas manter essa diferença perante seus concorrentes parece ser o maior esforço que deve ser feito pelas empresas, e mais, identificar qual realmente é seu diferencial é tarefa complexa e definida pelo cliente e não pelo empresário. O comércio existe para o mercado, dizia Fernando Pessoa em outro século. Até por isso que esse papo todo me parece velho, mas é fácil de esquecer, e não lembrar disso todos os dias, desde o empresário até a moça do balcão é fatal para o sucesso ou não dos negócios, sua manutenção e crescimento.

Já são 18h15, e vou correr para comprar um presunto fatiado na hora para agradar minha namorada antes que a mocinha lave as máquinas. Tchau!