sábado, 22 de dezembro de 2007

Mandem-na para o calabouço!


Deu na Mônica Bergamo que Dona Marisa mandou devolver uma escultura porque simplesmente não a suportava. Encomenda de Dona Ruth Cardoso para Elisa Bracher, uma obra em madeira para o jardim do Palácio da Alvorada, essa que é a casa do presidente, de sua primeira-dama e família. Não só devolveram, destruíram-na. Na minha casa não entra o que eu não gosto, mas aprendi desde pequeno que "em cavalo dado não se olha os dentes". Nesse caso além da casa ser minha mesmo, eu não sou casado com a presidente da república.
Crescendo e tomando coca-cola morna nos museus e galerias em que passei e conversando com os amigos que entendem de arte percebi que existe no ar um conceito que posso chamar de respeito à obra, seja qual fôr meu sentimento, um bom humano respeita a arte alheia por mais horrorosa que ela seja. Nesses anos de primeira-dama Dona Marisa não só passou pelos museus e galerias mais incríveis e exclusivos do mundo, como quando neles tomou os melhores caldos com presidentes, reis, rainhas, príncipes e princesas, além de primeiras-damas, a sensibilidade que lhe deveria caber foi suprimida. Imagino Dona Marisa e seus assessores dizendo algo do tipo: "Criados, esta escultura! Mandem-na para o calabouço!". Espero que não vão atrás do Lula perguntar o que ele acha, em mais uma das suas tentativas de ser gentil-sarcástico-engraçado-simplisinho-caipira vai dizer algo do tipo "Na minha casa a última palavra é minha 'Sim, senhora'". Se eu tentasse gostar do presidente e de sua primeira-dama seria difícil chegar lá.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2012200711.htm

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Cólcenter


- Shopping Grupo Brasil Mariana boa tarde no que posso estar lhe ajudando? - Boa tarde, Mariana. Minha mãe fez uma compra semana passada de uma tevê, gostaria de saber quando ela será entregue. - Óquei senhor estarei transferindo ao setor responsável aguarde um instante obrigada. - De nada. - Secretária eletrônica: Obrigado por escolher o Shopping Grupo Brasil. Sua ligação será atendida dentro de alguns instantes. Aguarde e "bouas" compras! - Música: Agora você pode comprar. Comprar! Shopping Grupo Brasil... Brasil! A melhor opção para não ter um natal vazio! - Shopping Grupo Brasil Roberto boa tarde no que posso estar lhe ajudando? - Boa tarde, Roberto. Minha mãe fez uma compra semana passada de uma tevê, gostaria de saber quando ela será entregue. - O senhor tem o código de compra em mãos senhor? - Sim, é zero trinta, trinta e quatro, noventa e nove, sessenta e sete. - Confirmando: zero trinta, trinta e quatro, noventa e nove, sessenta e sete. - Não. É noventa e nove antes do sessenta e sete. - Confirmando de novo: zero trinta, trinta e quatro, noventa e nove, sessenta e sete. - Confirmado. - Só um instante que estarei analisando em meu sistema. - Sim. - Música: Agora você pode comprar. Comprar! Shopping Grupo Brasil... Brasil! A melhor opção para não ter um natal vazio! - Senhor? - Sim? - A compra foi efetuada pelo senhor, senhor? - Não, senhor. - Como se chama? - Ferdinando. - Fernando do que, senhor? - Não! Ferdinando. - Ferdinando do que, senhor? - Ferdinando Ferreira dos Santos Oggio. Com dois gês. - Dois gês e ú? - Não, ô, gê, gê, i, ô. - Confirmando: Ô, gê, gê, i, ô. - Isso! - Ferdinando Ferreira dos Santos Oggio? - This is my name. - Desculpe, senhor? - Sou eu. - Senhor Ferdinando Ferreira dos Santos Oggio estarei transferindo sua ligação para o setor responsável aguarde um instante obrigado. - Não... peraí! - Música: Agora você pode comprar. Comprar! Shopping Grupo Brasil... Brasil! A melhor opção para não ter um natal vazio! - Shopping Grupo Brasil Luciana boa tarde no que posso estar lhe ajudando? - Luciana, você é a terceira pessoa que me atende, preciso de sua ajuda imediatamente. Minha mãe fez uma compra semana passada de uma tevê, gostaria de saber quando ela será entregue. - O senhor tem o código de compra em mãos senhor? - Sim, é zero trinta, trinta e quatro, noventa e nove, sessenta e sete. - Confirmando: zero trinta, trinta e quatro, noventa e nove, sessenta e sete. - Só um instante que estarei analisando em meu sistema. - Óquei. - Música: Agora você pode comprar. Comprar! Shopping Grupo Brasil... Brasil! A melhor opção para não ter um natal vazio! - A compra foi efetuada pelo senhor, senhor? - Não, Luciana. - Como se chama? - Ferdinando. - Fernando do que, senhor? - Não! Ferdinando Ferreira dos Santos Oggio. - É italiano? - Sim! Finalmente alguém sabe escrever meu sobrenome e ainda sabe que é italiano. Você é italiana? - Senhor Ferdinando Ferreira dos Santos Oggio estarei transferindo sua ligação para o setor responsável aguarde um instante obrigada. - Não, peraí! - Sim, senhor Fernando? - Ferdinando. - Sim, senhor Ferdinando? - Quem comprou a tevê foi minha mãe e não eu, é por isso que ninguém consegue me ajudar? - Sim, senhor, seria melhor sua mãe estar ligando para estarmos procurando a entrega da tevê, um terceiro dificulta muito nossa análise. - Mas, veja bem, Luciana. Minha mãe faleceu antes de ontem. Eu tenho que resolver esse problema. - Meus pêsames, senhor Fernan... Ferdinando, né? - Isso. - Como ia lhe dizendo, será difícil estar realizando a análise em nosso sistema. Neste caso o senhor tem de entrar em contato com o atendimento ao consumidor e enviar um atestado de óbito comprovante de filiação do senhor junto com a cópia do pedido de compra realizado por ela. - Mas você não faz atendimento Eu não acredito! É muita burocracia! - Senhor! Isso visa inteiramente a sua própria segurança, senhor. - A minha não, a da tevê, né?! Rã! - Senhor tem algo mais em que posso estar lhe ajudando? - Algo mais não! Quero saber quando a tevê será entregue. - Infelizmente essa informação não pode ser dada para terceiros. Somente sua mãe pode obter a informação. - Minha mãe morreu. - Sim, senhor, meus pêsames. Algo mais em que posso estar lhe ajudando? - Olha, Luciana, quando essa tevê chegar aqui eu vou quebrar inteirinha só de raiva de você e do sistema. - Apenas reúna a documentação necessária e envie senhor Ferdinando. - No fim das contas você é gentil, porque nesse cólcenter todo mundo parece um robô que opera o sistema e a senhora me deu alguma solução, mesmo que absurdamente burocrática, me deu. - Obrigado, senhor. Algo mais em que posso estar lhe ajudando? - Vá à merda! - Obrigado por escolher o Shopping Grupo Brasil, tenha um bom dia.

Foto: Ônibus vazios que levaram fiéis para Meca, na Arábia Saudita, Hasan Sarbakhshian/AP.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Pão de queijo da Haddock Lobo


Ao tomar meu café da manhã no Pão de Queijo Haddock Lobo percebi que beleza é reviver. Sim, é bonito, muito mais do que na minha infância, mas não tem nada mais espetacular no pão de queijo do Tião do que minhas lembranças de criança ao entrar nesse pequeno recinto de balcão refrigerado com uma cesta de vime média em cima, coberta por um pano listrado azul e branco igual ao da minha roupa de cama. Existe muita coisa além do sabor do pão, tem muita memória nisso. E a sensação nítida de quando levo pessoas conhecidas para comer o melhor pão de queijo do mundo comigo é de que para elas não tem nada demais além de um ótimo lanche, mas percebi ontem que assim como eu, a maioria dos que ali entram, querem comer um pedaço de coisas que têm sabores de infância, namoro e outros momentos bons. Assim se constata facilmente não pela fome ou satisfação gástrica, mas pelos olhares e expressões faciais iguais a mim. Quem não entende vá domingo de manhã entre nove e dez e meia tomar um cafezinho e comer um pão de queijo, é na Haddock Lobo entre a Lorena e a Oscar Freire, do lado direito da rua de quem desce, um toldinho azul anuncia.

sábado, 8 de dezembro de 2007

Peraí, Luiz Inácio! O senhor pegou pesado!

Sempre defendi o otimismo, mesmo em frente a tudo isso que tem acontecido no Brasil político. Acreditei no país. Mas me chamar de sonegador? O senhor pegou pesado. Eu não quero pagar mais CPMF, aí vem dizer que sem a contribuição não tem mais isso ou aquilo. OK, ninguém quer ver o povo do dia para a noite sem a merreca de recursos que ainda tem. Os cofres públicos estão cada dia mais sedentos, por um motivo ou por outro, o fato é que estão, é concordar com o óbvio. Luiz Inácio, o senhor é presidente da república e não um mero político a discursar idéias, é o chefe do poder executivo, o que e-x-e-c-u-t-a. Voltando ao assunto, o senhor e esses seus bordões vagos... Tenho é saudade do torneiro mecânico, se quer saber. Pode até alguém dizer que a acusação não é para mim. Eu não sonego, nunca soneguei e depois dessa o senhor fragilizou a certeza dos que nunca sonegariam, eu vou continuar firme e forte fazendo o download do programinha da Receita, sendo aliado dos cofres vazantes, mas não concordo com a CPMF e pronto.
Faz algum tempo que decidi escrever sobre seu governo, às vezes fico chateado como hoje, mas na maioria é divertido, Luiz Inácio, no mínimo.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Não-entrevista com funcionário revela sublinhas do afastamento de pesquisadores do Ipea

Desde o afastamento dos quatro pesquisadores (Fabio Giambiagi, Otávio Tourinho, Gervásio Rezende e Regis Bonelli) do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) o Mil ao Contrário tenta um furo de reportagem para a realização de uma não-entrevista com um deles, porém, neste domingo, com exclusividade, este blogue acessou por telefone um funcionário do prédio da administração do instituto que detalha com integridade as ondas cheias de opinião da rádio-peão sobre o acontecido. O mesmo preferiu manter seu anonimato.

Mil ao Contrário - Boa tarde, Xis. Em primeiro lugar gostaríamos de agradecer em nome dos leitores pela sua atenção.
Xis - Eu que agradeço, inclusive muito obrigado pelo livro do Paul Auster, estava vendo para comprá-lo.
MC - Sem problemas. Vamos aos detalhes que nos interessam. Qual sua impressão sobre a demissão dos pesquisadores?
X - Não chamaria de demissão, mas de afastamento. Eles são neoliberais, diz o governo, então o presidente achou melhor mandá-los passear.
MC - Presidente do Ipea [Márcio Pochman] ou do Brasil?
X - Aí você me pegou (risos).
MC - O que você achou disso?
X - Achei inteligente da parte deles. Econometria é muito dífícil, um saco!
MC - Um de nossos economistas comentou isso. Você não soube separar a opinião do presidente do instituto e do país. Qual sua dúvida?
X - Vejo que o presidente, do Brasil, tem seguido a tendência mundial de chefes de Estado mandões que adotam bordões totalitários. Tipo [Hugo] Chávez, [Vladmir] Putin e Evo Morales. O Brasil tá fashion, tá na moda! (risos).
MC - Sua opinião é cheia de raiva. Você gostava do trabalho dos pesquisadores?
X - Eu não entendo nada, já lhe disse que econometria me assusta, mas a imparcialidade do instituto sobreviveu ao governo militar, se bem que eram desorganizados mas moderninhos na política econômica, essa onda agora derrubou os adversários da opinião do Ipea. O Banco Central f. os caras.
MC - O Banco Central?
X - Lógico. O Banco Central é encruado, o Ipea tem hora que concorda, tem hora que discorda, mas isso é uma outra história. Os caras [os quatro pesquisadores afastados] eram durões de opinião. Tem a ver com poder.
MC - Poder?
X - Governo, poder, terceiro mandato, discurso plano, essas coisas...
MC - Obrigado pela atenção, Xis.
X - Obrigado a vocês, espero ter ajudado. Qualquer coisas estamos aí, aliás estou a fim do DVD novo com a história dos [Rolling] Stones (risos). Abraço e até mais (risos).
MC - (Risos) Óquei, um abraço.