Café da manhã no Mafalda

- O que você está fazendo aqui essas horas?
- Eu quero ir! Me deixe ir!
E soando quase como se fosse uma mãe, um pai eu falei baixo com os dentes cerrados:
- Maria Augusta Fagundes, o Mafalda não abre para o café da manhã!
- E daí? Eu vim buscar uma coisa que esqueci! Me larga, André!
Já segurava seu braço esquerdo e sentia o perfume exagerado e de feitiço que vinha do seu pescoço ainda branco da maquiagem. Ela tinha um olhar vazio, procurava entre as grades do portão uma chance para alguém vê-la. Mas certamente nem o vigia da noite estaria ali àquela hora. Então falei de uma vez:
- Guta, querida. Deixe. Eu venho aqui na hora do almoço e busco essa coisa sua.
- Você não busca nada.
Eu começava a sentir ciúme. Porque só tinha uma forma de ter esquecido alguma coisa no Mafalda, tendo ido lá. Não somos namorados, nada mesmo. Aquilo me intrigou. Eu estava começando a perder a paciência e decidi mais uma vez fazer uma incursão nos pulos que Maria Augusta já dava.
- Maria Augusta, só me diga o que você esqueceu aqui ontem à noite, eu busco para você.
- André, o que eu esqueci ontem a noite aqui não é segredo algum. O mistério é como não lembrar que estivemos aqui ontem. - terminou esse "ontem" com uma voz fina e colada num ponto de semi-interrogação.
O que ela havia esquecido era o boné que eu havia dado ontem mesmo. Um que disse que comprei em Málaga para ela em agosto.
Desenho de Adrian Tomine.